Recente levantamento do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) produziu uma fotografia nacional do fenômeno denominado “judicialização da saúde”. Diversos aspectos analisados, os quais afligem a todos envolvidos – representantes de instituições, gestores públicos e privados, pacientes e suas associações – geraram reportagens e artigos, com opiniões as mais diversas sobre o tema.
Chama a atenção a ausência da opinião do médico.
Quem mais sofre com a situação do paciente? O médico que procura dar o melhor tratamento que considera acertado, ou o magistrado angustiado entre o oferecido pelo estado/plano de saúde ou o prescrito pelo médico?
Creio que nenhum dos dois espera o resultado morte, apesar de esta ser, em algum momento, inevitável. A família está mais próxima do médico pressionando pelo melhor tratamento. O magistrado, mais distante, porém mais aflito por desconhecer a arte médica.
Quem aceita hoje em dia o evento morte?
Há alguns anos o casal perdia filhos. Viviam com mágoa, mas aceitavam o fato como uma circunstância da vida. Hoje em dia, sofre-se com a perda de familiares por acidente, por vítimas de crime, mas não se admite a perda por doença. Será o estado culpado da morte por doença?
Não se vislumbra preocupação com os sentimentos do doente. Por que a terapia de conforto não é valorizada?
E o familiar cuidador, quais os seus sentimentos, qual a sua própria perspectiva e qualidade de vida?
Há quem afirme que, diante de uma doença grave e de caminho inexorável em direção à morte, a família adoece junto. Ela merece? A sociedade não exige isto dela?
Nesta perspectiva será justo manter uma vida a qualquer custo – ônus do estado – sem qualquer perspectiva, ou mais justo garantir a saúde a um maior número de pessoas com futuro promissor?
Acreditem, mas estes aspectos pessoais são irrelevantes frente aos interesses envolvidos, os quais vão muito além dos aspectos colocados na reportagem.
Estes interesses fazem com que a judicialização da saúde seja objeto de análise em outros países como na Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica, México, Peru, Uruguai, Washington-USA, Quênia e Coréia do Sul, lugares onde tive oportunidade de palestrar e constatar haver a mesma aflição, em especial no fornecimento de medicamentos para doenças raras.
Reflexões sobre as emoções e os interesses dos mais variados setores fazem com que seja importante o diálogo entre médicos e juízes para encontrar o equilíbrio ético e moral, entre o direito à saúde e o direito a uma vida digna.
Dar tudo, nem sempre dignifica o doente.